Por Jeff Samson
26 de Agosto de 1999. 11h53 PM, Odessa, Texas.
Em três anos de carreira na SWAT, nunca tremi tanto e corri tão desesperado para encontrar o amor da minha vida, Madison. Ela me avisou muito para não ir e eu não precisava mesmo ter atendido aquela porra de ligação, mas era um grande amigo meu, o detetive Bill Davidson, que estava em apuros e precisava da minha ajuda. Daí Jeff, o grande “herói”, apenas com sua Magnum .40 e cinco balas, deixou sua mulher – seu maior tesouro – em casa, achando que a treta não era grande. Como eu fui idiota.
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Madison |
Às oito e meia da noite, cheguei num armazém abandonado ao sul da cidade, onde encontrei o Bill escondido atrás de uma árvore com seu revolver calibre 38, tremendo e ensopado de suor. Ele disse que estava prestes a capturar o “Cats Claw”, como era conhecido um assassino serial que já mandara oito pro saco em um mês sem ser apanhado, sem rosto e sem nome, praticamente um fantasma. Na investigação, meu amigo começou a seguir um cara suspeito em uma boate vagabunda. Depois de algumas doses de uísque, o sujeito saiu com duas vadias e Bill o seguiu até este armazém, onde ouviu gritos das garotas e um rugido assustador, tipo um cão feroz. Talvez o maníaco usasse o bicho para se livrar dos corpos, ou seja lá o que aquele doente fazia. Eu queria acreditar nessa merda enquanto prosseguíamos, mas não se podia ouvir latidos lá dentro, só o som da carne sendo rasgada e grunhidos de uma fera que começaram a endoidar a gente.
Bill não queria a polícia envolvida ainda. Ficou com medo de não dar certo e ele ser taxado como louco por isso, então preferiu me chamar. Eu, já impaciente com a situação, preparei a arma, e comecei a invadir o local. Bill me acompanhou, cobrindo a minha retaguarda. Invadir uma área perigosa sem apoio, medidas preliminares e eliminação de riscos era algo totalmente fora do nosso estilo, e aquilo me deixava nervoso, especialmente com o fato de que entrávamos nos domínios de um assassino doido que rosnava como um rottweiler – ali ele estava em casa e nós, no escuro.
Entramos pelos fundos do armazém, o mesmo caminho que o assassino pegara. Bill respirava muito alto e tremia muito, por isso o que quer que estivesse lá dentro sabia que nós estávamos invadindo e parou com o barulho. Tentei acalmar Bill com um olhar severo e me pus à frente, vigiando à frente e em cima, enquanto ele cuidaria da retaguarda e dos flancos.
No vão principal, muito sangue, lixo e pedaços de carne humana no chão. Serial Killer é pouco: o sujeito era uma versão espalhafatosa do Hannibal, isso sim. Enquanto eu analisava o sangue ainda fresco, Bill se recostou em mim, tremento e resfolegando como em um choro amedrontado. Olhei para trás a tempo de vê-lo ser arremessado sobre um amontoado de barris e caixotes perto da parede à direita. Fora pego por um brutamontes de quase dois metros de altura vestindo em trapos, com cabelos na altura do ombros, olhos amarelados e presas. Ele estava banhado em sangue e ainda mastigava um pedaço de carne, sorrindo debilmente pra mim.
– Parado aí, amigo! – voz de prisão de praxe. A coisa inclinou sua cabeça para a esquerda e, em uma nesga de sorriso, murmurou minhas palavras como se duvidasse delas, e veio lentamente em minha direção. Sem pestanejar meti três balas no seu peito, mas o cara tinha o peito de aço! Ele nem pareceu sentir os tiros que derrubariam até um elefante, e continuou a se aproximar ainda sorrindo. Estarrecido como eu estava, quase nem ofereci reação quando ele me segurou pelo pescoço e me ergueu com apenas uma das mãos, enquanto suas unhas de gato estraçalhavam a pele do meu braço direito. Eu não podia gritar com seu aperto, mas Bill quebrou uma caixa de madeira em suas costas para chamar a atenção e ele afrouxou. Porém, fui arremessado no velho amigo e nós fomos ao chão feito dois bichos atropelados. O filho da mãe limpou o sangue das mãos e olhou pra mim como se me conhecesse há tempos, mas eu não fazia a menor ideia do que era aquela merda toda.
– Você é filho do maldito Tony Samson, né? Parece que nossas linhagens se cruzam de novo, veja só.
Apavorado que estava, não ouvi direito mais nenhuma palavra que ele continuou a falar sobre mim e meu pai e estendeu suas garras na nossa direção. Bill tinha quebrado a perna esquerda na queda e parecia prestes a apagar, nos tirando as chances de puxar o carro. De repente um estrondo nos deixou com o ouvido zunindo, e tivemos a impressão de ver a coisa sendo baleada nas costas e fugir como um cão ferido. Nosso salvador, um velhote com a cara bastante marcado, me levantou e ajudou a fazer uma tala na perna de Bill.
– Leve seu amigo para o hospital, garoto – disse ele – Eu assumo daqui.
Antes de sair, ele ainda me jogou um cartão com o nome Harvey Rickman e um número de telefone. Ao chegar no hospital com Bill e encaminhá-lo, liguei para o sujeito, que me disse estar seguindo os rastros do assassino. Lembrei que a coisa parecia me conhecer – e ao meu velho – e mencionei isso a ele, e Harvey disse que a criatura poderia querer retaliar a mim ou a algum ente querido, porque provavelmente saberia onde eu morava. Imediatamente pensei em Maddie, que agora corria perigo. Corri para o carro e enquanto dirigia para casa, liguei desesperadamente para saber se estava tudo bem com ela, mas ninguém atendia. Descontrolado, bati com a picape em um ônibus e entrei de vez em uma loja.
Eu estava tonto e machucado, mas não podia apagar de jeito nenhum. As pernas funcionavam, saí mancando feito um louco, correndo a pé. Chegando em casa, tudo revirado, a porta arrombada e a janela quebrada. "Fugiu, boa garota", pensei. Avistei rastros de sangue, rezando para que fossem do maníaco, e os segui pela vizinhança que dormia sem saber do demônio que rondava o bairro. Na rua de trás, avistei Harvey esbaforido e tive a pior visão da minha vida, que destruiu de vez o cara feliz, um amoroso marido e um policial exemplar que eu era até então.
Maddie estava em cima de um carro, vermelho do sangue da minha mulher, com o homem uivando sobre seu corpo.
Eu estava quebrado. Enquanto corria debilmente em direção a ela, Harvey atirou meticulosamente na testa e no peito do monstro, que caiu inerte. Eu chorava e uivava a morte da minha esposa, portanto lembro apenas que o velhote disse que não podia ficar para encarar a polícia.
...
Uma semana depois, o telefone tocou:
– Espero que seja rápido – atendeu um ranzinza Harvey.
– Harvey? É o Jeff, o cara de Odessa de uma semana atrás, lembra de mim? – perguntei, com voz trêmula e rouca.
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Harvey |
– Ah... Que merda, moleque! São seis horas da madrugada cara, o que você quer?
– Eu cansei de sofrer pelo que aconteceu, quero saber o que era aquilo, por que matou minha mulher e o que tinha a ver comigo.
– Heh, muito bem, muito bem. Qual a sua profissão, garoto?
– Caí fora da SWAT, senhor – disse com alívio – por quê?
– Muito bom, porque a minha profissão é a melhor para alguém na sua situação. Venha para cá, deixe sua vida aí em Odessa, traga suas coisas para entrar em uma nova merda. – parecia até que o velhote estava feliz com a notícia.
– Já tô na estrada – desliguei.
Ganhei o mundo a bordo da minha velha picape preta reformada, agora com o nome de Devil´s Dick – meu jeito de dar um foda-se ao mundo –, escutando Cash e com a foto de Madison pendurada no retrovisor, sorrindo pra mim como sempre vai ser nos meus pensamentos.
...
– Acho que o Harvey só não te ensinou uma coisa.
– O quê?
– A prestar mais atenção na vigília. Só escutei isso tudo porque você me pagou aquelas cervejas, mas já é quase hora do fantasma atacar.
– Três da madruga,certo?
– E meia.
– Até agora nada. Tá sentindo esse frio desgraçado?
– É ele. Vamulá.
– Espera aí Marshall, você... Porra, sua piranha lésbica! Urgh!